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O clientelismo e a Doutrina Social Católica

Jay RichardsSobre o autor

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Introdução

As encíclicas com as quais os Católicos identificam a Doutrina Social Católica, começando com a Rerum novarum, de Leão XIII, em 1891, examinam questões relacionadas com aquilo que poderíamos chamar de economia política. Leão XIII, por exemplo, escreveu sobre trabalho, capital, capitalismo, socialismo, propriedade privada e coisas do género. E podemos encontrar estes termos nas últimas encíclicas promulgadas pelo Papa Francisco.

No entanto, esta tradição parece omissa em relação àquilo que se tornou, indiscutivelmente, a forma mais comum de economia política e a que podemos chamar capitalismo clientelista ou clientelismo.[1] Este sistema não corresponde ao ideal de governo pequeno e mercado livre dos liberais clássicos e de muitos conservadores norte-americanos. Também não é o socialismo de estado que dominou grande parte do mundo no século XX e que continua a existir na Coreia do Norte e em Cuba. Na sua essência, o clientelismo é uma forma de conluio entre o estado administrativo e as grandes empresas. Implica a concentração de poder entre aquilo a que chamamos frequentemente as esferas “pública” e “privada”.

Neste capítulo, vamos analisar a luz que a Doutrina Social Católica pode lançar sobre o clientelismo, como a Santa Sé poderia responder a esta economia política informal e se está bem posicionada para o fazer.

A definição de clientelismo

Enquanto sistema económico, o clientelismo partilha algumas características com o fascismo do século XX. Mas este termo carrega hoje conotações com as ditaduras, o racismo, o antissemitismo e o militarismo da Itália fascista, da Espanha franquista e da Alemanha Nazi e é menos provável descrever estes sistemas económicos como “corporativistas”. Esta é uma forma de aliança entre entidades políticas e empresarias, incluindo cartéis industriais e cooperativas. Em teoria, o corporativismo representa uma economia hierarquizada dirigida por elites políticas, empresariais e até eclesiásticas que cooperam, segundo elas, para o bem comum. Não precisa de envolver uma ditadura literal, uma teoria racial ou militarismo – todas as características normalmente associadas ao fascismo.[2] No século XX, muitos intelectuais e clérigos Católicos apoiaram o corporativismo como uma suposta “terceira via” entre o capitalismo liberal e o socialismo,[3] aspeto que discutiremos adiante.

Ao contrário do corporativismo, o clientelismo não é uma teoria de economia política por direito próprio. É, antes, a situação para a qual muitas economias modernas evoluem devido a incentivos nas esferas política e económica. De certa forma, o sistema chinês emergente é uma forma de clientelismo, com um estado especialmente poderoso. Mas uma forma aparentemente mais benigna é comum em democracias liberais com mercados vibrantes, empresas privadas e baixos níveis de corrupção criminal. Isto pode parecer paradoxal para aqueles que assumem que as empresas privadas preferem sempre competir num mercado livre e que, por isso, se opõem ao estado regulador. Na verdade, o clientelismo não constituiria uma surpresa para a maioria dos defensores de uma economia livre, desde Adam Smith, no século XVIII, a Thomas Sowell, no século XXI. Todos estes pensadores trataram o clientelismo como um perigo perene. Isto porque uma empresa privada, especialmente uma empresa grande e pouco virtuosa, pode ter todo o prazer em suportar encargos regulatórios se esses encargos prejudicarem desproporcionalmente atuais e/ou potenciais concorrentes.

O conluio e os cartéis entre concorrentes para fixar preços ou ofertas são quase sempre ilegais nas economias modernas. Mas o clientelismo pode ser legal. De facto, os reguladores reformados podem ter carreiras lucrativas como lobistas de empresas privadas, em parte porque são especialistas em navegar as regulações bizantinas que eles previamente escreveram e aplicaram. Os economistas chamam a este clientelismo clássico “captura regulatória” (Dal Bo, 2006). É assim que o clientelismo tende a começar. Contudo, no final do século XX, começamos a testemunhar o aparecimento de uma forma nova e mais abrangente. Se o clientelismo clássico envolve cooperação ou conluio entre governo e grandes empresas, o clientelismo de largo espectro inclui organizações sem fins lucrativos e de beneficência, instituições culturais e dos media e organizações transnacionais como as Nações Unidas e o Fórum Económico Mundial.

O clientelismo, portanto, não se parece com o socialismo homogéneo da antiga União Soviética, que reduziu radicalmente a propriedade privada e reprimiu a esfera privada com indústria e agricultura estatais e um aparelho violento de segurança e vigilância. Em contraste, o clientelismo mantém diferentes esferas institucionais, mesmo quando estas esferas se tornam uma máquina de controlo social cada vez maior e mais unitária.[4]

A Doutrina Social Católica não refere explicitamente este clientelismo, o que torna a nossa tarefa difícil. Mas existem afinidades entre clientelismo e corporativismo e essas afinidades desempenham um papel positivo em algumas encíclicas sociais proeminentes. Ora, isto obriga-nos a fazer uma pergunta incómoda: até que ponto a Santa Sé está consciente dos perigos do clientelismo? Será que a sua falta de sensibilidade passada e presente para estes perigos a torna suscetível a eles?

Como veremos, os princípios da Doutrina Social Católica lançam uma luz esclarecedora sobre o tema do clientelismo. No entanto, a julgar por acontecimento recentes, a própria Santa Sé parece mal preparada para lidar com uma economia política que não se enquadra nas categorias típicas do liberalismo, capitalismo ou socialismo. De facto, décadas de simpatia pelo corporativismo podem até levar alguns eclesiásticos a ver no clientelismo um sistema próximo, que deve ser acarinhado em vez de desafiado. Há alguns sinais recentes de que a Santa Sé está muito menos preparada para lidar com o clientelismo do que deveria.

A Doutrina Social Católica e os modelos económicos

Desde a Rerum novarum do Papa Leão XIII, em 1891, a Igreja tem procurado aplicar as verdades perenes da lei natural e da fé Católica às condições sociais concretas. Alguns entendem que, na Doutrina Social Católica, o Magistério propõe um programa político detalhado que constitui uma “terceira via” entre capitalismo e socialismo.[5] E é possível encontrar nas encíclicas afirmações pormenorizadas sobre propriedade privada, sindicalização, ajuda externa, corporações profissionais e políticas salariais e de emprego, bem como críticas ao socialismo, ao capitalismo, ao liberalismo e ao “neoliberalismo”.

Esta terceira via é frequentemente identificada com o corporativismo ou o distributivismo. Randall K. Morck e Bernard Yin Yeung, por exemplo, argumentam que “o corporativismo foi a doutrina social católica romana entre a década de 1890 e a década de 1960” (2010, 2). Distributivistas como Hilaire Belloc e G. K. Chesterton sublinham a distribuição generalizada da “propriedade produtiva” e afirmam que o seu modelo é, ou pelo menos se baseia, na Doutrina Social Católica. Estes pensadores, por outras palavras, veem a Doutrina Social Católica como um modelo económico específico com políticas económicas específicas.

Isto não é totalmente implausível. Samuel Gregg defende que a visão corporativista aparece em Rerum novarum (1891) e torna-se central na encíclica Quadragesimo anno (1931), de Pio XI. De acordo com Gregg, “Pio XI parece ir mais longe do que o seu predecessor, ao propor formalmente como deve ser uma ordem social derivada da Doutrina Social Católica” (2019, 102). A sua encíclica e outras encorajaram o corporativismo no pensamento social Católico, especialmente no mundo alemão entre os democratas cristãos após a Segunda Guerra Mundial. Antes disso, influenciou políticas de regimes como o de Vichy em França, o de Franco em Espanha e, como notamos antes, o de Mussolini em Itália. É também visível em vários países da América Latina. Por outro lado, João XXIII parece despromover o corporativismo em Mater et magistra (1961). E encíclicas posteriores, especialmente Centesimus annus (1991), são mais simpáticas com a economia de mercado do que com o corporativismo.

Consequentemente, não seria correto identificar inequivocamente o corporativismo com os princípios fundamentais da Doutrina Social Católica. De facto, identificar quer o corporativismo quer o distributivismo com a Doutrina Social Católica é contradizer os princípios da tradição. Em Centesimus annus, S. João Paulo II insistiu que “a Igreja não tem modelos a propor” (43) e que “a fé cristã não presume encarcerar num esquema rígido a variável realidade sociopolítica” (46). Na sua encíclica de 1987, Sollicitudo rei socialis, escreveu: “A doutrina social da Igreja não é uma «terceira via» entre capitalismo liberal e coletivismo marxista (…): ela constitui por si mesma uma categoria.” (41)

Por esta razão, em 1986, a Congregação para a Doutrina da Fé (CDF) esclareceu que os documentos relevantes incluem frequentemente “juízos contingentes” que devem ser distinguidos do núcleo da Doutrina Social da Igreja. Por exemplo, na Instrução sobre a liberdade cristã e a libertação, o CDF explicou que a Igreja “oferece, em sua doutrina social, um conjunto de princípios de reflexão, de critérios de julgamento” (72). Mas mesmo sem estas declarações de João Paulo II e as qualificações da CDF, há demasiada diversidade interna entre os documentos para identificar a Doutrina Social Católica com o corporativismo ou qualquer modelo económico único.

Além disso, tratar a Doutrina Social Católica como um programa político detalhado abre-a a objeções devastadoras. Não é difícil encontrar afirmações factuais e económicas no corpus da Doutrina Social Católica. O filósofo John Finnis resume esses problemas num capítulo de A Radical Critique of Catholic Social Teaching (2019). De acordo com Finnis, a Doutrina Social Católica interpretada deste modo é prejudicada pelos seguintes fatores:

(1) ambiguidade quanto ao seu âmbito ou temática; (2) falta de atenção à sua dependência de juízos sobre factos empíricos e probabilidades, e/ou sobre outros fatores contingentes e preferências diversas, mas não irrazoáveis, inerentes a qualquer aplicação da Regra de Ouro; e (3) pressupostos inadequados de que os párocos são os principais responsáveis por fazer tais julgamentos e avaliações e por decidir e escolher como os leigos devem agir de acordo com eles. Grande parte da Doutrina Social Católica (não toda) deve ser formulada hipoteticamente: se julgar que tais e tais factos se verificam ou são prováveis, então (a menos que julgue que certos outros factos não se verificam ou são improváveis), os verdadeiros princípios e as normas morais, confirmados pela revelação divina, determinam que deve escolher assim e assim. (p. 548)

Se propusesse uma plataforma política detalhada, a Doutrina Social Católica reduzir-se-ia a tentativas efémeras de Papas a falar sobre assuntos sobre os quais não têm especial autoridade ou competência. Não é uma surpresa que Finnis aconselhe os eclesiásticos a deixarem de oferecer tais conselhos:

Por conseguinte, os Papas e os outros bispos devem envolver-se pouco no assunto, para além de relembrar, a todos, os verdadeiros princípios e normas, a tempo e fora de tempo. Os seus documentos ou pregações não precisam de abordar a Doutrina Social Católica com mais frequência do que outras questões de moralidade. E órgãos da Santa Sé ou conferências episcopais dedicadas à Doutrina Social Católica são desnecessárias. (2019, 548)

Uma alternativa que explica estas dificuldades é reconhecer que o mandato de autoridade da Doutrina Social Católica é bastante limitado. Seguindo a orientação da CDF, de 1986, devemos ver a Doutrina Social Católica como uma tradição centenária que procura aplicar princípios perenes enraizados na teologia Católica e na lei natural às condições sociais e económicas em mudança. Estes são aquilo a que Finnis se refere como “os verdadeiros princípios e normas morais, confirmados pela revelação divina” (2019, 548).

Infelizmente, não há uma lista canónica destes princípios. Mas eles incluem: a dignidade intrínseca da pessoa humana desde a conceção até à morte natural; o casamento e a família como unidades fundamentais da sociedade; o bem comum; a subsidiariedade; a solidariedade e a igualdade humana; a razão e a lei natural; a dignidade do trabalho e dos trabalhadores; a realidade dos direitos humanos e das responsabilidades humanas; o direito à propriedade privada; e a nossa gestão do mundo natural. Estes princípios têm uma influência muito maior na consciência Católica do que as várias formas como os Papas e os responsáveis da Igreja tentaram aplicá-los.

Enquadrar as questões desta forma tem, claro, os seus próprios problemas. Como notamos, as cartas apostólicas, as encíclicas e outros documentos semelhantes raramente se limitam a princípios abstratos. Também contêm pressupostos científicos e económicos e fazem afirmações com base nesses pressupostos. Isto significa que podemos e devemos distinguir as questões não-negociáveis de “fé e moralidade” (sobre as quais o Magistério tem autoridade divinamente protegida) da aplicação prudencial dessas questões, que se baseiam em observações empíricas e pressupostos teóricos, e não apenas em princípios normativos. Nestas conjunções complexas de proposições, o Magistério não tem proteção especial e pode, por isso, cometer erros. Por exemplo, o Papa Francisco escreveu em Laudato Si que “a Igreja não pretende definir as questões científicas nem substituir-se à política” (188). Essa tarefa não nos é entregue pelo Magistério já pronta.

Ao lidar com o clientelismo, o papel dos leigos é importante por três razões. Em primeiro lugar, a Santa Sé tem oferecido pouca reflexão explícita sobre esta forma política. Em segundo lugar, devido em parte ao apoio ao corporativismo em alguns documentos da Doutrina Social Católica, a Santa Sé é, indiscutivelmente, vulnerável ao clientelismo, com o qual o corporativismo partilha uma semelhança familiar. E, em terceiro lugar, as aplicações da Doutrina Social Católica à economia política devem basear-se na realidade económica (Richards, 2020). Nenhuma teoria que ignore, por exemplo, o papel dos incentivos ou a relação entre oferta e procura ou que não tenha em consideração o papel dos preços na transmissão de informação, pode ter muita esperança de promover o florescimento humano. E qualquer tentativa de reduzir a pobreza generalizada que ignore o nosso conhecimento sobre a forma de o fazer – através, por exemplo, de um estado de direito, dos direitos de propriedade, da liberdade económica e da inovação – é, na melhor das hipóteses, deficiente, se não mesmo prejudicial.

Quando era diretor da Congregação para a Doutrina da Fé, Joseph Ratzinger apelou a esse esforço:

Uma moral que se julga capaz de prescindir do conhecimento técnico das leis económicas não é moral, mas moralismo. Como tal, é a antítese da moral. Uma abordagem científica que se julga capaz de gerir sem um ethos não compreende a realidade do homem. Por essa razão, não é científica. Hoje precisamos de um máximo de conhecimento económico especializado, mas também de um máximo de ethos para que o conhecimento económico especializado possa entrar ao serviço dos objetivos certos. (Ratzinger, 1986, 4)

Munidos de conhecimento económico, os princípios da Doutrina Social Católica podem ajudar os analistas leigos a pensar como Católicos sobre clientelismo, e talvez ajudar a Santa Sé a reconhecer esta forma de economia política pelo que ela é.

Clientelismo: como começa

O clientelismo pode começar com a melhor das intenções. Talvez um exercício hipotético possa ilustrar a questão. Imaginemos que uma crise na banca privada conduz a um desemprego maciço e a várias situações de falência. Nas democracias liberais, as autoridades eleitas sentem uma forte pressão dos eleitores para que atuem no sentido de aliviar o sofrimento. Assim, estes atores políticos podem criar uma agência de regulação que, segundo eles, evitará novas crises. Precisando de especialistas para dirigir a agência, o melhor lugar para os encontrar é no setor bancário onde a crise teve lugar. Os bancos, por seu turno, têm agora de lidar com uma nova entidade reguladora e contratam lobistas para representar os seus interesses. Estes lobistas fazem parte do mesmo grupo de pares, e podem ser até antigos colegas, dos novos reguladores.

A agência procura cumprir a sua missão, mas é possível que não consiga evitar crises futuras. De facto, talvez a crise original tenha sido ela mesma resultado de uma prévia tentativa regulatória bem-intencionada, mas mal direcionada, para evitar uma crise. E assim, quando surge uma nova crise, os responsáveis eleitos têm um novo incentivo para criar novas agências de regulação e os setores regulados têm ainda mais incentivos para fazer lóbi junto dos reguladores. Assim, as grandes indústrias privadas capazes de navegar no terreno regulatório crescem a par – e evoluem em conjunto – de um estado regulador cada vez mais amplo.

Esta reação de incentivos é a sementeira a partir da qual o clientelismo cresce. Envolve ações racionais, ainda que com interesse próprio, de empresas privadas, políticos e reguladores governamentais. E pode acontecer mesmo sem os motivos mais básicos de ganância e desejo de poder. Mas estes motivos podem estimular uma reação e criar uma situação em que é difícil entrar no setor sem os recursos necessários para navegar na paisagem regulatória. Assim, as grandes empresas prosperam a par de uma regulação alargada, enquanto as empresas novas e mais pequenas têm dificuldade em competir.

Mas o “clientelismo de largo espectro” envolve muito mais do que isso. O homem não vive apenas de economia e política. Não quer apenas acumular fortuna e poder. De facto, à medida que a sua riqueza cresce, um industrial ou empresário pode encontrar mais satisfação, e até mais estatuto social, ao falar de paz mundial, ao tentar erradicar a fome e as doenças, ao divulgar ideias de “liberdade sexual” e “igualdade matrimonial” e ao querer salvar o planeta. Os empresários tornam-se, então, filantropos e lobistas políticos. Pensemos em Bill Gates e George Soros: ambos acumularam fortunas no valor de muitos milhares de milhões de dólares no setor privado; depois, passaram décadas como filantropos igualmente poderosos e influentes. É claro que a filantropia é, em si mesma, virtuosa, mas alguns tipos de filantropia podem estar ligados ao lóbi político que alimenta o desenvolvimento das elites globais. Qualquer análise sólida ao clientelismo do início do século XXI tem de considerar esta alteração de papéis e as instituições sociais que a englobam.

Um caso de estudo sobre o clientelismo: a crise financeira de 2008

A crise financeira de 2008 nos Estados Unidos constitui um exemplo por excelência de clientelismo de largo espectro. Os meios de comunicação social focaram-se em vilões estereotipados: a ganância de Wall Street, a desregulação e a concorrência sem restrições – todos considerados culpados pela lei federal conhecida como “Dodd-Frank Act”, de 2010, supostamente destinada a evitar outra crise.

A história amplamente aceite está, contudo, longe de ser a verdade. Descrevi em detalhe a verdadeira história no meu livro Infiltrated (2013). A forma mais simples de a apresentar é ponderar uma questão simples: num mercado livre – regido por um estado de direito fiável, mas com pouca microgestão política – teriam existido empréstimos “NINJA”? Teriam sido comuns? Estes famosos empréstimos estavam disponíveis para devedores “sem rendimentos, trabalho ou ativos” ainda em 2007. Mesmo partindo do princípio de que os credores são movidos por avareza, seria provável que eles concedessem empréstimos de que duvidavam vir a ser pagos? Normalmente, não. Algo tinha certamente perturbado os incentivos normais do mercado hipotecário, incluindo os sinais de preço. Esse algo foi um amplo leque de “objetivos de habitação a preços acessíveis”, implementados, ao longo de várias décadas, por muitos departamentos governamentais para aumentar a aquisição de casa própria entre os norte-americanos com rendimentos mais baixos.

Graças ao trabalho de Edward Pinto e Peter Wallison e, mais tarde, da Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos, sabemos que, em resultado desses esforços para expandir a aquisição de casa própria, em 2008 havia cerca de 27 milhões de empréstimos “não tradicionais”, “subprime” e outros empréstimos de risco. As empresas patrocinadas pelo governo, Fannie Mae e Freddie Mac, detinham 12 milhões desses empréstimos – que compraram no mercado secundário sob rígidas exigências de quotas impostas pelo Congresso. A Federal Housing Administration (FHA) e outras agências federais detinham 5 milhões e os programas da Community Reinvestment Act e do House and Urban Development (HUD) detinham outros 2,2 milhões. Isto perfaz um total de 19,2 milhões de empréstimos de risco detidos por entidades controladas pelo governo federal. Apenas em 7,8 milhões de empréstimos é que o risco estava inteiramente nas mãos de credores privados.

Paralelamente a este mercado de empréstimos de risco, cresceu um entendimento implícito de que as grandes instituições financeiras, pelo menos coletivamente, beneficiariam de uma rede de segurança patrocinada pelo governo se entrassem em problemas. Elas passaram a acreditar que eram “too big to fail”. Ou melhor, agiram como se fossem demasiado grandes para que o governo as deixasse falir. Esta atitude conduziu a um grave perigo moral, em que os bancos estavam dispostos a assumir muitos mais riscos do que assumiriam se soubessem que teriam de suportar todas as consequências de um fracasso. Um relatório do Federal Reserve Bank of Richmond, de 2013 e republicado em 2015, afirmava:

Numa série de incidentes ocorridos a partir da década de 1970, o Fed, em cooperação com a Federal Deposit Insurance Corporation, interveio para limitar os efeitos da falência bancária sobre os credores. As primeiras intervenções foram relativamente pequenas, mas criaram precedentes que levaram potenciais credores a esperar ser resgatados em futuras situações de dificuldades financeiras, enfraquecendo os seus incentivos para limitar a assunção de riscos e a vulnerabilidade dos mutuários. Os programas de empréstimo do governo pareciam muitas vezes estabilizar os mercados porque confirmavam as esperanças de intervenção, pelo que foram saudados como um sucesso. Mas isto aconteceu à custa do perigo moral de maior assunção de riscos e maior instabilidade a prazo. (Haltom e Lacker, 2015, 3)

Esta forma de apoio governamental aos mercados financeiros é uma característica particularmente proeminente do sistema financeiro norte-americano, que foi o centro da crise financeira. A crise não foi fruto de desregulação ou de um mercado livre “desregulado” a que faltou controlo governamental – afinal, dois terços de todos os empréstimos de risco “eram detidos pelo governo ou por entidades que atuavam sob o seu controlo” (Wallison, 2011, 453), e existiam em grande parte devido às agressivas políticas governamentais de habitação implementadas ao longo de várias décadas. Mas encorajou o comportamento de instituições privadas que teria sido impensável sem a ideia de uma salvaguarda de emergência patrocinada pelo governo. Esta foi a condição sine qua non da crise financeira de 2008.

Um dos efeitos foi o colapso dos setores financeiros envolvidos em hipotecas e títulos hipotecários. É uma ilustração perfeita do que pode acontecer quando os governos interferem com o poder de coordenação dos preços num mercado competitivo que funciona corretamente. Infelizmente, em vez de se retirar do mercado privado da habitação, o governo reforçou o seu papel. Primeiro, nacionalizou efetivamente “as empresas patrocinadas pelo governo”, Fannie Mae e Freddie Mac, fornecendo subsídios governamentais a investidores privados; depois, orquestrou a aquisição de instituições financeiras importantes e forçou empréstimos aos nove maiores bancos dos Estados Unidos.

Mais tarde veio o Dodd-Frank Act de 2010, assim chamado em referência a dois membros do Congresso que tinham sido defensores apaixonados da política de habitação governamental: Chris Dodd e Barney Frank. Entre as muitas disposições desta lei contava-se um apelo à designação de grandes bancos e empresas financeiras como “instituições financeiras de importância sistémica”. Por outras palavras, esta lei tornou explícita a política governamental de “too big to fail”. A lei de 848 páginas também criou uma nova agência reguladora, o Consumer Financial Protection Bureau, com poderes alargados sobre todo o setor financeiro da economia – incluindo áreas que nada tinham a ver com a crise financeira. Sob a direção desta nova lei, as agências federais acrescentam agora 6 milhões de novas palavras de regulação todos os anos.[6] Nenhum legislador eleito desempenha um papel nestas regulações; são os reguladores e os lobistas empresariais que o fazem.

A crise financeira deveria ter servido de lição sobre o que pode acontecer quando a disciplina do mercado é distorcida por incentivos regulatórios. Isto não quer dizer que nunca haverá falhas nos mercados financeiros sem aquele tipo de intervenção – a natureza humana garante que haverá. Contudo, cada intervenção significativa do governo nestes mercados tornou a próxima crise financeira mais provável ou agravou os seus efeitos. E o fracasso de cada intervenção torna-se uma desculpa para mais intervenção.

Numa economia de mercado saudável, os custos estão ligados aos benefícios empresariais. Os empresários que investem as suas poupanças num negócio podem ter sucesso ou fracassar e isto ajuda a manter o foco e a disciplinar os riscos que aceitam. O clientelismo, pelo contrário, tende a separar custos e benefícios. No pior dos casos, privatiza os lucros e socializa os custos. O insucesso tende a reforçar as relações entre as empresas e as entidades reguladoras, que são, desde o início, problemáticas.

As consequências da crise

Alguns repararam no clientelismo entre o governo e os grandes bancos que receberam empréstimos ou resgates. Mas poucos observadores se aperceberam do clientelismo fora das esferas empresariais e política, e que incluía atores dos meios de comunicação e do mundo filantrópico e sem fins lucrativos, todos eles com uma influência excessiva na crise e nas suas consequências legislativas. Este clientelismo em sentido amplo era um prenúncio do futuro.

Por exemplo, em agosto de 2010, o ativista da habitação Martin Eakes gabou-se, perante uma reunião de estudantes de MBA da Duke University, de que as ideias que tinha criado na organização sem fins lucrativos que fundou – chamada Self-Help Credit Union – eram agora a lei do país. Referia-se às disposições do Dodd-Frank Wall Street Reform and Consumer Protection Act, que tinha sido aprovado no mês anterior. As ideias regulatórias têm de eclodir em algum lado, claro. Mas a declaração de Eakes revelava que o clientelismo pode ir além das relações entre empresas e governo. Em primeiro lugar, ele e a sua Self-Help não-lucrativa foram atores-chave nos empréstimos de alto risco e líderes de claque dos objetivos governamentais de “habitação a preços acessíveis”. De facto, Eakes desempenhou um papel importante na mediação de empréstimos de risco de bancos privados relutantes a uma Fannie Mae inicialmente reticente.

Em segundo lugar, afirmou no mesmo discurso que o braço nacional de lóbi do Self-Help, o Center for Responsible Lending (CRL), tinha “contratado cinquenta advogados, PhDs e MBAs para, basicamente, aterrorizar o setor dos serviços financeiros quanto a qualquer das suas práticas abusivas em todo o país” (Richards, 2013, 65). O CRL foi inspirado e financiado principalmente pelo proprietário da California Savings & Loan, Herbert Sandler, que queria que o trabalho de Eakes tivesse um impacto nacional (a Self-Help possui agora um edifício de dez andares em Washington, DC, a poucos quarteirões a norte da Casa Branca). Sandler e a sua mulher, Marion Sandler, foram notícia em 2008, no auge da crise financeira, em resultado de o seu banco ter sido pioneiro no “empréstimo com opção ARM”, que o New York Times chamou de “Typhoid Mary” da crise imobiliária.[7] E a revista Time colocou o casal entre as 25 pessoas culpadas pela crise financeira.

Os Sandlers, contudo, não sofreram danos irreparáveis com esta má imprensa temporária ou com a própria crise na habitação. Em 2006, no auge da bolha imobiliária, venderam a sua empresa por 24,3 mil milhões de dólares à Wachovia, da Carolina do Norte, que entrou em falência dois anos mais tarde.[8] Isto permitiu aos Sandlers engordar a sua fundação de caridade, tornando-a numa das trinta maiores fundações do país. Começaram imediatamente a financiar manobras mediáticas que ofereciam a metanarrativa da ganância de Wall Street e da desregulação republicana que supostamente conduziram à crise financeira. Também continuaram a financiar fortemente a organização sem fins lucrativos CRL.

Herb Sandler compareceu perante a Comissão de Inquérito sobre a Crise Financeira, mas o relatório final preservou cuidadosamente a sua autodefesa e racionalizações. O político californiano que presidia a essa comissão, Phil Angelides, tinha beneficiado do apoio de Sandler enquanto tesoureiro do estado da Califórnia. Nessa qualidade, Angelides tinha canalizado o dinheiro das pensões dos sindicatos dos funcionários públicos e dos professores para “empresas de capital de risco em áreas carenciadas” e “habitação a preços acessíveis”.

Com tanta fertilização cruzada, era inevitável que muitos dos elementos nesta rede fossem parar às burocracias federais. Um exemplo disso é Mark Pearce, que se tornou diretor da Division of Depositor and Consumer Protection da Federal Deposit Insurance Corporation (FDIC). Em 2010, foi-nos dito que os Estados Undos precisavam de uma nova agência – a Consumer Financial Protection Bureau – para proteger os consumidores, uma vez que as outras agências (como a FDIC) não o conseguiam fazer. No entanto, nesse mesmo ano, a FDIC criou a sua própria divisão de proteção do consumidor, que conta agora com muitas centenas de funcionários. Pearce foi, durante muito tempo, funcionário da Self-Help e foi o primeiro presidente da CRL,[9] com a sua horda de “terroristas financeiros”. As raposas não foram apenas contratadas para gerir o galinheiro: elas determinaram os seus alicerces.

Este é apenas um pequeno capítulo de uma saga muito mais vasta do clientelismo de largo espectro – algum à vista, outro nos bastidores – que desempenhou um papel crucial tanto na crise financeira como na sua resposta oficial. Envolveu não apenas agências governamentais e empresas privadas, mas também filantropos, instituições de caridade sem fins lucrativos e organizações de ativistas. E foi um modelo para o clientelismo que estava para chegar.

A Santa Sé não viu o clientelismo que esteve na origem da crise financeira

A crise financeira de 2008 é relevante para este capítulo porque a Santa Sé reagiu a ela. Essa resposta dá-nos o melhor exemplo de como a Igreja, na sua doutrina, não conseguiu responder ao clientelismo. Em 2018, uma década depois da crise, a Igreja publicou Oeconomicae et pecuniariae quaestiones (“Considerações para um discernimento ético sobre alguns aspectos do atual sistema económico-financeiro”; daqui em diante, OPQ). É o mais próximo que temos de uma interpretação oficial da Igreja sobre a crise financeira de 2008.[10]

A reivindicação moral indisputável de OPQ é a de que a pessoa humana deve estar no centro de qualquer discussão económica, e que o dinheiro e a economia têm sempre uma dimensão ética. A dignidade humana e o bem comum são temas recorrentes ao longo do texto. As secções 1, 2 e 4 discutem os critérios éticos para julgar os mercados e as finanças. O OPQ também afirma a bondade do setor financeiro (15) e do lucro (23) para satisfazer as necessidades humanas. E, embora evite ataques abrangentes ao setor financeiro em geral, tende a tratá-lo como distinto da “economia real” – uma expressão que usa doze vezes.

Infelizmente, o documento está também marcado por conceções erróneas sobre a crise financeira. Especificamente, defende que a crise foi causada por ganância individual e coletiva, instrumentos financeiros demasiado complexos e avarentos e falta de regulação nacional e supranacional dos mercados financeiros. O seu argumento básico é o de que a autossuficiência dos mercados é um mito (21) – por conseguinte, a regulação dos mercados financeiros deve ser muito mais rigorosa para evitar futuras crises. Esta ideia segue os estereótipos dos media sobre as causas da crise. Consideremos a invocação da ganância: este vício é universal, e não há qualquer prova de que a ganância fosse mais desenfreada em 2008 do que, por exemplo, em 1998. Apontar a ganância como a causa da crise é como apontar a presença de uma atmosfera rica em oxigénio para explicar por que razão um carro explodiu à frente da casa de um procurador: não se aponta para a condição sine qua non do acontecimento.

O apelo a uma maior regulação dos mercados financeiros também não considera as principais lições da crise financeira. Em primeiro lugar, o sistema financeiro de 2008 já era o setor mais regulado da economia norte-americana, e já era definido pelos protocolos bancários internacionais, como o Acordo de Basileia I e o Acordo de Basileia II,[11] e por uma complexa rede de acordos comerciais. Por essa razão, não havia um mercado autossuficiente – o que quer que isso significasse.

Em segundo lugar, e como já foi referido, a regulação desempenhou um papel decisivo na crise. Através das diretivas sobre habitação, o governo federal criou uma procura volumosa de habitação através de empréstimos de risco e o mercado forneceu-os. O OPQ menciona brevemente esses empréstimos, mas trata-os como produtos de atores privados mal-intencionados, sem mostrar qualquer consciência de que foram as políticas e as regulações sobre habitação a criar e incentivar estes empréstimos em primeiro lugar. (25)

Em terceiro lugar, o OPQ interpreta mal o papel dos títulos financeiros. É verdade que a securitização e os diversos produtos derivados ampliaram e globalizaram os efeitos destes empréstimos de risco. Mas o problema foi agravado e incentivado por ratings enganosos que subestimaram os verdadeiros riscos destes produtos. Esses ratings e o recurso à securitização foram encorajados por um ambiente regulatório internacional, em que os requisitos de capital dos bancos eram determinados pelos ratings de crédito dos títulos financeiros. De muitas formas, esses títulos ajudaram a diversificar o risco dentro do sistema financeiro, razão pela qual o sistema de regulação incentivou a sua utilização. Além disso, eles não foram a causa da crise, contrariamente à sugestão do OPQ (26): sem os empréstimos de risco subjacentes, os instrumentos financeiros não teriam sido um problema.

Por último, quando o OPQ se refere aos pormenores da regulação, a sua ênfase é frequentemente errada. Um exemplo é a sua afirmação de que a “crise sistémica” poderia ter sido evitada se certas “responsabilidades bancárias” tivessem sido separadas (22). Esta parece ser uma referência oblíqua à chamada “Regra Volcker”, que separa a banca de investimento da banca comercial. Mas não há qualquer exemplo de como a separação dessas funções teria atenuado a crise. Pelo contrário, se a Regra Volcker estivesse em vigor em 2008, os danos poderiam ter sido ainda piores. No auge da crise, o Bank of America – um banco comercial – comprou o Merrill Lynch, um banco de investimento, o que evitou a falência deste. E em março de 2008, Bear Stearns, o primeiro banco de investimento a ter problemas, foi adquirido pelo JP Morgan Chase, um banco comercial. Por conseguinte, se a barreira recomendada pelo OPQ entre bancos comerciais e bancos de investimento estivesse em vigor, poderia muito bem ter tornado a crise mais grave, em vez de menos.

Este é um exemplo daquilo que John Finnis refere como a “dependência” frequente na Doutrina Social Católica “de juízos sobre factos empíricos e probabilidades”. E, neste caso, o juízo está errado. Em suma, apesar de a Santa Sé ter dez anos de retrospetiva, não conseguiu discernir as formas de clientelismo que se manifestaram na crise financeira de 2008 e, em vez disso, baseou-se em estereótipos populares, mas enganadores.

O risco de captura clientelista no Vaticano

 “Rome Call for AI Ethics”

A falta de sensibilidade da hierarquia para os perigos do clientelismo parece particularmente evidente na sua recente iniciativa sobre inteligência artificial (IA). A 28 de fevereiro de 2019, a Pontifícia Academia para a Vida patrocinou uma conferência para lançar a iniciativa. O documento de abertura, “Rome Call for AI Ethics” [Roma apela à ética na IA], repete as verdades morais que nenhum Católico contestará. A essência do documento é que a IA deve ser desenvolvida para servir a humanidade e o bem comum. De facto, para além de acrescentar alguns truísmos teológicos, a declaração não oferece qualquer visão nova ou acrescenta uma abordagem Católica nova sobre o assunto. Em vez disso, apela para que a IA ajude as pessoas, melhore a educação, respeite a privacidade e não discrimine.

Por que razão foi a declaração tão genérica? Talvez a justificação se encontre no facto de o Arcebispo Paglia se ter juntado, como signatário, a Brad Smith, presidente da Microsoft, John Kelly III, vice-presidente da IBM, Dongyu Qu, diretor-geral da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), e Paola Pisano, representante do governo italiano. David Sassoli, presidente do Parlamento Europeu, também participou no evento. Os eventos anteriores do Vaticano incluíram outras personalidades do mundo empresarial; e, em 2018, uma hackathon (maratona de programação) do Vaticano contou com o apoio da Google, da Salesforce e da Microsoft.

Estes são os parceiros da iniciativa em curso. Assim, o que podemos esperar para além da sabedoria convencional? Qual é a probabilidade de, por exemplo, obtermos uma crítica robusta à metafísica materialista e à falsa visão do homem e da máquina tão comum na literatura e na comunidade da IA?

Um perigo possível é o facto de essas relações entre empresas, organizações transnacionais e o Vaticano, em iniciativas tão específicas, encorajarem o clientelismo de uma forma mais ampla. Uma declaração assinada pelos responsáveis da IBM e da Microsoft, que insiste que “novas formas de regulação devem ser encorajadas para promover a transparência e a conformidade com princípios éticos”, poderia facilmente levar a que atores empresariais gigantes conspirassem com o governo para impedir a entrada de pequenos concorrentes no mercado. Isto pode fazer parecer que o governo está a responsabilizar as empresas privadas. Mas, na realidade, as agências governamentais relevantes podem ser capturadas pelas grandes e bem-estabelecidas empresas que afirmam estar a regular. Estas agências acabam por, mais do que regular, elaborar regulação que impede a entrada de futuros concorrentes.

É claro que estas ações são sempre defendidas por razões virtuosas: segurança pública, saúde pública, transparência e o bem comum. Mas deveria a Igreja e, em particular, a Pontifícia Academia para a Vida associarem-se à IBM e à Microsoft para declarações sobre a regulação da tecnologia? Tendo em conta os interesses financeiros destas organizações, tal poderia servir para dar cobertura moral às grandes empresas tecnológicas nos seus apelos à regulação da concorrência.

Conselho em prol de um Capitalismo Inclusivo

Há um outro exemplo, ainda mais preocupante, de dezembro de 2020. Com muita fanfarra, o Vaticano anunciou que estava a estabelecer uma parceria com titãs mundiais para apoiar uma nova organização chamada Council for Inclusive Capitalism [Conselho em prol de um Capitalismo Inclusivo].[12] A reunião inicial incluiu ministros das finanças de vários países, bem como o diretor do Fundo Monetário Internacional. De acordo com o Papa Francisco, o objetivo é reduzir a pobreza e a desigualdade.

Os membros do conselho são chamados “Guardiões” e “afirmaram que, nas suas respetivas empresas, planeiam contratar e promover mais mulheres, aumentar a diversidade na contratação, comprometer-se com energia limpa através da compra de eletricidade 100% renovável, reduzir a emissão de gases com efeito de estufa, promover a reutilização e a reciclagem de água e outras iniciativas”.[13] Não é claro como todas estas iniciativas vão resolver a pobreza ou reduzir a desigualdade. Entre os Guardiões estão o presidente e CEO da Mastercard, o diretor executivo da Dupont, o presidente do conselho de administração e CEO da Johnson & Johnson, o CEO da BP, o presidente do conselho de administração e CEO do Bank of America e o presidente e CEO da State Street Corporation.

Podemos assumir que estas iniciativas são bem-intencionadas e, de facto, podem ser adequadas. Mas é importante proceder com precaução. Por um lado, é possível ajudar as organizações empresariais a serem mais éticas cooperando com elas desta forma; mas, por outro, esta abordagem pode servir de fachada às empresas, uma vez que estas utilizam as suas ligações em organizações mundiais e nos governos para promover os seus próprios interesses.

O caminho a seguir: a importância de identificar o clientelismo

O Vaticano não relacionou o clientelismo com a crise financeira e tem, frequentemente, dado apoio tácito a modelos de cooperação entre as grandes empresas e o governo que podem encorajar o clientelismo. No entanto, o Papa Francisco identificou o risco de forma muito clara em Laudato si. Neste capítulo, salientamos a forma de clientelismo através da qual interesses do setor privado podem capturar os sistemas de regulação e usá-los para sua própria vantagem. Em Laudato si, o Papa Francisco identifica uma forma diferente de clientelismo em que as empresas evitam a lei de forma corrupta para beneficiarem os seus interesses privados e os interesses dos políticos:

Muitas vezes, a própria política é responsável pelo seu descrédito, devido à corrupção e à falta de boas políticas públicas. Se o Estado não cumpre o seu papel numa região, alguns grupos económicos podem-se apresentar como benfeitores e apropriar-se do poder real, sentindo-se autorizados a não observar certas normas até se chegar às diferentes formas de criminalidade organizada, tráfico de pessoas, narcotráfico e violência muito difícil de erradicar. (197)

Relações corruptas entre empresas e governos são comuns em muitos países. E a experiência deste problema na América Central e do Sul pode explicar o exemplo do Papa Francisco. Dada a natureza decaída do homem e os recursos que estão à disposição do governo e das empresas, existe o perigo real de que as relações próximas entre ambos possam dar origem a oportunidades de enriquecimento que prejudicam o bem comum.

Um exemplo na América do Sul é o escândalo “lavagem de carros”.[14] Esta saga envolveu uma empresa nacionalizada, empresas privadas e políticos. O montante total de dinheiro desviado para interesses pessoais não é conhecido, mas é, provavelmente, superior a 2 mil milhões de dólares. O desenrolar do escândalo contribuiu para uma forte recessão e inflação no Brasil e, certamente, para a perda de confiança no governo e para o aumento do populismo, criticado na encíclica mais recente do Papa Francisco, Fratelli tutti.

A Doutrina Social Católica oferece, de facto, orientações sobre o clientelismo. Os católicos, e a própria Santa Sé, fariam bem em aproveitar os seus recursos para desenvolver o pensamento social Católico e a Doutrina Social Católica sobre o assunto. Muitos dos princípios da Doutrina Social Católica – como a propriedade privada, o bem comum, a solidariedade, a equidade e a subsidiariedade – estão relacionados com o clientelismo. E há também o conteúdo mais amplo da própria teologia Cristã: um tratamento completo exigiria mais do que um capítulo, pelo que nos focaremos na subsidiariedade e no pecado original.

Uma correta consideração da subsidiariedade

Em Quadragesimo anno, Pio XI resume o princípio da subsidiariedade ao defender a existência de instituições não-estatais e referindo-se a ele como “aquele solene princípio da filosofia social” que “permanece imutável”:

[A]ssim como é injusto subtrair aos indivíduos o que eles podem efetuar com a própria iniciativa e indústria, para o confiar à coletividade, do mesmo modo passar para uma sociedade maior e mais elevada o que sociedades menores e inferiores podiam conseguir, é uma injustiça, um grave dano e perturbação da boa ordem social. O fim natural da sociedade e da sua ação é coadjuvar os seus membros, não destruí-los nem absorvê-los. (79)[15]

A subsidiariedade implica um juízo normativo sobre as jurisdições e as responsabilidades das várias instituições. Algumas instituições devem ter jurisdição ou responsabilidade primária sobre alguns domínios e funções; outras devem ter uma responsabilidade secundária ou terciária, e assim por diante; e algumas não devem ter responsabilidade sobre uma jurisdição. Uma consideração completa de como a subsidiariedade se aplica numa sociedade deve, então, responder, para cada instituição ou esfera social, às seguintes questões:

Esta instituição tem jurisdição própria sobre X?

onde X é um domínio ou função. Os exemplos incluem educar filhos, comprar uma casa, cultivar legumes, vender carros usados, declarar guerra e estabelecer um limite de velocidade numa estrada secundária. Se uma instituição tem, ou deveria ter, jurisdição sobre X, então essa instituição deve, em princípio, ser competente para exercer essa responsabilidade. A competência é uma condição necessária para a jurisdição própria.

Se a resposta a (1) for “não”, então essa instituição não deve, pura e simplesmente, ter responsabilidade sobre X. Se a resposta for “sim”, então a pergunta seguinte é:

Esta instituição tem jurisdição primária, secundária, terciária, etc., sobre X?

O modo como se responde a (1) e (2) pode depender, em parte, da filosofia política defendida pela pessoa que responde. Mas as respostas também devem depender da observação e da experiência. Sabemos, por exemplo, que as mães e os pais devem ser os principais responsáveis pela educação dos filhos. Como? Refletindo sobre a natureza humana, através de uma leitura cuidada da Sagrada Escritura e da Sagrada Tradição, e observando que a maioria das culturas, ao longo da história, reconheceu este facto.

Definir subsidiariedade, o que a Doutrina Social Católica faz, é uma coisa. Responder a (1) e (2) de forma precisa é mais difícil. Assim, coloca-se a questão de saber que instituição deve ter a jurisdição primária quando se trata de determinar as condições em que as pessoas negoceiam, incluindo os preços, numa economia?

Pode argumentar-se que o princípio da subsidiariedade, assim como a razão e a experiência humanas sugerem que nenhuma instituição humana tem competência literal para determinar estas coisas. O estado deve, no entanto, garantir que o mercado é gerido pelas regras de direito geral, incluindo direitos robustos de propriedade e contratuais, num contexto que permita que os preços se alterem livremente com base nas interações entre compradores e vendedores, seguindo as suas próprias avaliações subjetivas e incentivos.

Quando os estados tentam exercer um controlo mais direto sobre os mercados – fixando preços, estabelecendo quotas, etc. –, estão a desvirtuar a função informativa dos preços, o que conduz a distorções como escassez e excedentes ou desperdícios. Desta forma, os estados demonstram que não têm competência para determinar os preços. E se o estado carece de competência para o fazer, então não pode ser responsável por isso. Além disso, esta forma de intervir nos mercados aproxima as empresas do estado e cria as oportunidades de clientelismo que discutimos.

Este modo de pensar parece estar de acordo com o parágrafo 42 de Centesimus annus, que expressa a opinião de que uma economia livre é a forma desejável de organização económica, mas que o estado deve garantir que o mercado opera dentro de um quadro jurídico que funcione bem. Desta forma, os preços num mercado concorrencial resultam de inúmeras interações dos intervenientes no mercado. O estado desempenha um papel que é essencial e que está dentro da sua competência; por sua vez, as empresas e os indivíduos são capazes de fazer o que só eles podem fazer.

Isto também nos ajuda a ver um dos problemas do clientelismo. Um mercado que funcione adequadamente permite que as empresas compitam por clientes, investidores e trabalhadores, de acordo com as mesmas regras legais. A “concorrência” não tem aqui quaisquer conotações darwinistas. Se duas pessoas quiserem o mesmo galão de gasolina, a sua competição pelo combustível é um facto. É essa a natureza da escassez. A questão é saber como resolvê-la. Sabemos, por longa experiência, que mercados competitivos melhoram geralmente a qualidade e baixam o preço desses bens, colocando-os onde são mais valorizados. Ou, pelo menos, fazem-no melhor do que qualquer outra alternativa conhecida. Enquanto “processo de descoberta”,[16] um mercado é melhor – para os clientes, para os empregados e para o bem comum – se incluir muitas empresas a competir por clientes e trabalhadores. A alternativa não é a irmandade dos homens ou a cooperação universal: é um monopólio.

Um monopólio literal envolve, normalmente, não só um único fornecedor, mas também barreiras injustas à entrada de potenciais concorrentes, geralmente reforçadas pelo governo e, frequentemente, como resultado de um processo de clientelismo. Isto reduz drasticamente os benefícios dos mercados. No entanto, para além de monopólios literais, também existem quase-monopólios, que criam problemas similares. Um quase-monopólio é um cartel e acontece quando os concorrentes entram em conluio para restringir a oferta, controlar os preços e bloquear a concorrência. Estes são ilegais nos países desenvolvidos.

O clientelismo é outra forma, mais proteica, de quase-monopólio, que tem praticamente o mesmo efeito que um cartel. O clientelismo perturba o funcionamento dos mercados ao destruir as fronteiras próprias das diferentes instituições. Assim, em vez de, digamos, as entidades reguladoras nacionais e as empresas poderosas desempenharem funções complementares de acordo com o princípio da subsidiariedade, podem juntar-se para servir o seu próprio benefício restrito à custa de outros e em detrimento do bem comum.

Se se permitir que o governo e as empresas desempenhem papéis distintos e diferentes na economia, existirá uma distância entre eles. Pode haver situações particulares em que o governo pode intervir razoavelmente, por exemplo, para garantir o fornecimento de uma vacina numa base equitativa durante uma pandemia, para lidar com o monopólio ou para evitar danos ambientais. Contudo, e como diz o Compêndio da Doutrina Social da Igreja: “esta suplência institucional não se deve prolongar e estender além do estritamente necessário, já que encontra justificação somente no caráter excecional da situação” (188). Embora esta afirmação não se relacione com o clientelismo, o facto de os governos não intervirem na esfera económica a não ser que seja estritamente necessário torna menos provável o desenvolvimento de relações clientelistas entre a política e as empresas. Os negócios e a política têm o seu próprio domínio. O estado não deve assumir o papel das empresas e, se o faz, corre-se o risco de as empresas assumirem o domínio da política, como adverte o Papa Francisco em Fratelli tutti (177).

O pecado original

Outro princípio relacionado, e que é fundamental na teologia Cristã, é o princípio do pecado original. “Alguns novos teólogos contestam o pecado original”, gracejou G. K. Chesterton, em Orthodoxy, “que é a única parte da teologia Cristã que pode realmente ser provada”. A doutrina da separação de poderes na Constituição norte-americana é famosa por ser atribuída a uma convicção generalizada, de inspiração calvinista, de que não se deve confiar a ninguém demasiado poder sobre os outros. Como James Madison diz n’O Federalista n.º 51:

Se os homens fossem anjos nenhuma espécie de governo seria necessária. Se fossem os anjos a governar os homens, não seriam necessários controlos externos nem internos sobre o governo. Ao construir um governo em que a administração será feita por homens sobre outros homens, a maior dificuldade reside nisto: primeiro é preciso habilitar o governo a controlar os governados; e, seguidamente, obrigar o governo a controlar-se a si próprio.[17]

Esta convicção, de que alguém deve guardar os guardiões, não é exclusiva do calvinismo. Ainda assim, a importância política do pecado original tem sido, por vezes, menos proeminente na Doutrina Social Católica do que poderia ter sido. Em Rerum Novarum, por exemplo, o Papa Leão XIII estava certo em apelar à harmonia e à cooperação entre capital e trabalho numa polis Católica hierarquizada. Mas pode ter sido, como Randall Morck e Bernard Yin Yeung afirmam na sua crítica ao corporativismo na Doutrina Social Católica, “excessivamente confiante ao afirmar que a Igreja possui os instrumentos capazes «de levar o homem a obedecer às imposições do dever, a dominar as suas paixões, a amar a Deus e ao seu próximo» (15).” E continuam:

O poder corrompe até os Católicos devotos. As elites menos vulneráveis a perturbações por aquisições, concorrência estrangeira ou mobilidade económica sem entraves de jovens talentosos exercem um poder mais absoluto e, nessa medida, correm o risco de uma corrupção mais absoluta. Os cartéis santificados pelo corporativismo despojam a propriedade privada do seu propósito social: a libertação das forças de mercado para efetuar tais perturbações e realocar recursos para onde são mais valiosos. Sem a liberdade de mudar de emprego, reequipar as fábricas e criar novos mercados, a propriedade privada não é mais do que a mão morta do privilégio entrincheirado. (Morck e Yin Yeung, 2010, 40)

Uma abordagem adequada das esferas sociais – da subsidiariedade – deve incluir uma visão realista da natureza corrupta dos seres humanos. Em particular, deve reconhecer que o contrabalançar de interesses entre esferas é, por vezes, a melhor forma de promover a cooperação e o bem comum. Um alinhamento confortável de interesses entre as elites poderosas no governo, nas empresas, nas organizações sem fins lucrativos, na filantropia e na cultura raramente é um sinal de harmonia, mas antes de poder concentrado e corrupto nas mãos de poucos.

Se a Santa Sé quer ajudar os católicos fiéis a navegar no labirinto bizantino do clientelismo do século XXI, precisa de desenvolver estas ideias e evitar envolvimentos com as elites poderosas no centro do labirinto. Precisa de abraçar a visão de um antigo crítico, Lord Acton, que insistiu que “o poder tende a corromper” mesmo Papas e Reis, “e o poder absoluto corrompe absolutamente.”[18] As provas sugerem que o clientelismo está a tornar-se a forma dominante de economia política, pelo que não há tempo a perder.

Referências

Dal Bó, E. (2006), Regulatory Capture: A Review, Oxford Review of Economic Policy, 22 (2), 203-22.

Hayek, F. A. (2002), Competition as a Discovery Procedure, The Quarterly Journal of Austrian Economics 5(3), 9-23.

Finnis, J. (2019), “A Radical Critique of Catholic Social Teaching,” in Bradley G. and Brugger E. (eds.), Catholic Social Teaching: A Volume of Scholarly Essays, Cambridge: Cambridge University Press.

Gregg, S. (2019), “Quadragesimo anno (1931)”, in Bradley G. and Brugger E. (eds.), Catholic Social Teaching: A Volume of Scholarly Essays, Cambridge: Cambridge University Press.

Haltom, R. e Lacker, J. M. (2015), Should the Fed Have a Financial Stability Mandate? Lessons from the Fed’s First 100 Years, Economic Quarterly 101(1), 49-75.

McLaughlin, P. (2014), Measuring the Dodd Frank Act (and Other Major Acts) with Regdata 2.0, Regulation (September 23, 2014); URL:

https://www.mercatus.org/publications/regulation/measuring-dodd-frank-act-and-other-major-acts-regdata-20.

Morck, R. K. e Yeung, B. Y. (2010), Corporatism and the Ghost of the Third Way, Capitalism and Society, 5(3), article 2, https://ssrn.com/abstract=2209136.

Pontifical Council for Justice and Peace (2005), Compendium of the Social Doctrine of the Church, London: Burns & Oates.

Ratzinger, J. (1986), Church and Economy: Responsibility for the Future of the World Economy, Communio, 13, 200-204.

Richards, J. W. (2020), What Economists Know, Believe, and Debate, Journal of Markets & Morality 23(1), 117-130.

Richards, J. W. (2013), Infiltrated, New York: McGraw Hill.

Wallison, P. (2011), Official “Dissent” to the Financial Crisis Inquiry Report, Official Government Edition (revised February 25, 2011), at: http://www.gpo.gov/fdsys/pkg/GPO-FCIC/pdf/GPO-FCIC.pdf.

Williamson, P. J. (1985), Varieties of Corporatism: A conceptual discussion, Cambridge: Cambridge University Press.

Encíclicas papais e outros documentos referidos neste capítulo

Francisco, 2020, Fratelli tutti, carta encíclica:

https://www.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-francesco_20201003_enciclica-fratelli-tutti.html

Congregação para a Doutrina da Fé e Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral, 2018, Oeconomicae et pecuniariae quaestiones (Considerações para um discernimento ético sobre alguns aspetos do atual sistema económico-financeiro): https://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/documents/rc_con_cfaith_doc_20180106_oeconomicae-et-pecuniariae_po.html

Francisco, 2015, Laudato si’, carta encíclica:

https://www.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-francesco_20150524_enciclica-laudato-si.html

João Paulo II, 1991, Centesimus annus, carta encíclica:

https://www.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/encyclicals/documents/hf_jp-ii_enc_01051991_centesimus-annus.html

João Paulo II, 1987, Sollicitudo rei socialis, carta encíclica:

https://www.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/encyclicals/documents/hf_jp-ii_enc_30121987_sollicitudo-rei-socialis.html

Congregação para a Doutrina da Fé, 1986, Instrução sobre a Liberdade Cristã e a Libertação:

https://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/documents/rc_con_cfaith_doc_19860322_freedom-liberation_po.html

Pio XI, 1931, Quadragesimo anno, carta encíclica:

https://www.vatican.va/content/pius-xi/pt/encyclicals/documents/hf_p-xi_enc_19310515_quadragesimo-anno.html

Leão XIII, 1891, Rerum novarum, carta encíclica:

https://www.vatican.va/content/leo-xiii/pt/encyclicals/documents/hf_l-xiii_enc_15051891_rerum-novarum.html

Questões para discussão

Quem é responsável pela criação das condições em que o capitalismo clientelista se desenvolve e prospera?

Por que razão é tão difícil reverter o clientelismo?

Em que medida é o princípio da subsidiariedade importante para fazer recuar o capitalismo clientelista?

Quais foram os elementos do capitalismo clientelista que se destacaram na crise financeira?

Qual é a diferença entre capitalismo clientelista e socialismo?

Notas de rodapé

[1] O autor usa, no original em língua inglesa, o termo “cronyism” e a expressão “crony capitalism”, que optamos por traduzir por “clientelismo” e “capitalismo clientelista”, embora seja também recorrente, entre nós, os termos “compadrio” e “capitalismo de compadrio” para remeter para a mesma ideia. (N.T.)

[3] Cf. Morck e Yeung (2010); e, para uma boa abordagem geral às formas de corporativismo, cf. Williamson (1985).

[4] Descrevendo a sua própria visão do fascismo totalitário, Mussolini disse: “Tudo dentro do Estado, nada contra o Estado, nada fora do Estado.” O clientelismo não é uma filosofia política distinta e, por isso, nunca teria um lema. Mas, como tendência, caminha para “tudo dentro da máquina, nada contra a máquina, nada fora da máquina”. A máquina é a esfera amorfa do controlo social que emerge do conluio, nos bastidores, de instituições poderosas que podem permanecer visivelmente e até legalmente independentes.

[5] Cf. https://www.thecatholicthing.org/2014/08/30/the-myth-of-catholic-social-teaching-2/.

[6] Cf. https://www.mercatus.org/publications/regulation/measuring-dodd-frank-act-and-other-major-acts-regdata-20.

[7] A expressão “Typhoid Mary” remete para Mary Mallon (1869-1938), uma cozinheira norte-americana de origem irlandesa que terá infetado dezenas de pessoas com febre tifóide. (N.T.)

[8] Foi comprada pela Wells Fargo em 2008. (N.T.)

[9] Cf. https://www.fdic.gov/about/comein/biosPearce.html.

[10] Embora os meios de comunicação social tenham dado ao OPQ uma cobertura bajuladora, este foi objeto de poucas análises sérias. A única reação importante veio do presidente (Católico) da Commodity Futures Trading Commission, juntamente com o seu economista principal. Os dois escreveram uma carta aberta à Santa Sé, corrigindo o que consideravam ser graves erros e equívocos no documento, que envolviam derivados e swaps de risco de incumprimento.

Cf. https://cftc.gov/PressRoom/SpeechesTestimony/giancarloresponsetobollettino072118.

[11] Cf. https://www.bis.org/publ/bcbsca.htm.

[12] Cf. https://www.inclusivecapitalism.com.

[13] Cf. https://www.forbes.com/sites/jackkelly/2020/12/09/pope-francis-partners-with-corporate-titans-to-make-capitalism-more-inclusive-and-fair-is-this-for-real-or-just-corporate-virtue-signaling.

[14] Cf. https://www.britannica.com/event/Petrobras-scandal.

[15] Como a tradução portuguesa desta encíclica não contém a numeração por parágrafos, todos os números indicados de Quadragesimo anno remetem para a versão em língua inglesa. (N.T.)

[16] F. A. von Hayek descreveu a concorrência como um processo de descoberta em Hayek (2002), que corresponde a uma tradução de Marcellus S. Snow da conferência de Hayek, de 1968, “Der Wettbewerb als Entdeckungsverfahren”, patrocinada pelo Institut für Weltwirtschaft da Universidade de Kiel.

[17] Tradução portuguesa de Viriato Soromenho-Marques e João C. S. Duarte, Fundação Calouste Gulbenkian, 2011. (N.T.)

[18] Acton escreveu isto numa carta ao bispo anglicano Mandell Creighton, em 5 de abril de 1887, discutindo a forma como os historiadores devem tratar as ações corruptas dos Papas.

Cf. https://oll.libertyfund.org/quotes/214.

Sobre o autor

Jay Richards é Diretor do Richard and Helen DeVos Center for Life, Religion, and Family e William E. Simon Senior Research Fellow in American Principles and Public Policy na The Heritage Foundation. É membro sénior do Discovery Institute e editor executivo do The Stream. Jay é autor e editor de mais de uma dúzia de livros, incluindo os bestsellers do New York Times, Infiltrated (2013) e Indivisible (2012). É também criador e produtor executivo de vários documentários, incluindo três que foram amplamente exibidos na PBS.

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